A fim traçar um perfil das pessoas envolvidas em atividades criminosas nas favelas brasileiras, o Instituto Data Favela lançou a pesquisa inédita "Raio-X da Vida Real". Segundo o levantamento, 58% afirmaram que deixariam o crime se tivessem oportunidade de trabalho legalizado. No entanto, esses mesmos entrevistados alegaram que isso esbarraria em obstáculos — como a dificuldade de garantir outra forma de sustento e o risco de represálias caso tentassem deixar a criminalidade. A pesquisa ouviu mais de quatro mil entrevistados. Quer aumentar a renda? Curso capacita mototaxistas para atuar como condutores de turismo comunitário 'Escola de MEI': curso descomplica a vida de quem quer abrir o próprio negócio Considerando apenas os que gostariam de deixar a criminalidade por um trabalho formal, mas encontram empecilhos, 33% alegaram dificuldade de conseguir outra fonte de renda. Outros 26% disseram ter medo dos riscos de vida trazidos por essa decisão. Já 17% alegaram que encontrariam dificuldade de sustentar a família. Diferenças nos estados A quantidade de pessoas que disseram ter vontade de deixar o tráfico variou nos 23 estados onde a pesquisa foi realizada. Em Rondônia e no Rio, sete em cada dez (74% e 70%, respectivamente) entrevistados responderam que largariam o tráfico por oportunidades de trabalho. Na sequência, apareceram Goiás (63%), São Paulo (53%) e Bahia (51%). Por outro lado, o Distrito Federal registrou apenas 7% de respondentes com essa disponibilidade. Em relação ao que fazer ao deixar o crime, 22% responderam que têm vontade de abrir o próprio negócio (maior parte das respostas). “(Preferia) Montar meu próprio negócio e viver tranquilo sem que a polícia me fizesse nenhum mal”, disse um dos entrevistados durante a pesquisa. A declaração consta do material divulgado pelo Instituto Data Favela nesta segunda-feira (dia 17). Outros 20% se declararam abertos a aceitar um emprego com carteira assinada. Oportunidades profissionais que ofereçam horários flexíveis seriam alternativas para 15% dos respondentes. Falta de formação Sobre a base educacional, 41% disseram que se pudessem teriam estudado e se formado. Direito seria o curso escolhido por 18%. Administração (13%), Medicina/Enfermagem e Engenharia/Arquitetura (ambos com 11%) completariam a lista. Três em cada quatro (35%) pessoas envolvidas com o crime não completaram o ensino fundamental. Outros 16% não concluíram o ensino médio. “Teria estudado e me afastado das drogasˮ, disse um dos participantes da pesquisa. Entrada no crime Quase a metade dos entrevistados apontou a falta de dinheiro como a principal causa para entrar no crime (49%). Violência, alcoolismo e drogas foram citadas em 13% das respostas. Entre os mais jovens (13 a 16 anos), 18,4% disseram que entraram na ilegalidade por viverem na rua ou em abrigo e sem trabalho. — Só entrevistamos pessoas de 13 anos para cima — detalha Geraldo Tadeu Monteiro, técnico do Data Favela. A falta de perspectiva das pessoas envolvidas com tráfico também fica evidente em suas visões de futuro familiar: 84% afirmaram que não deixariam um filho entrar para o crime. Dificuldades de sair do crime Para Cleo Santana, copresidente do Data Favela, as dificuldades de deixar o crime são intensificadas porque o mercado de trabalho ainda precisa avançar na inclusão de egressos do sistema penal. De acordo com a pesquisa, 55% já foram presos pelo menos uma vez na vida. — Esse dado desmistifica a percepção de que o crime dá muito dinheiro. Estar no crime como atividade que enriquece é uma ilusão. E quando se dão conta, eles já não têm escolha, porque fica muito difícil ser reabsorvido no mercado, além do que a saída do poder paralelo pode pôr em risco a própria família — explica Cleo Santana, copresidente do Data Favela. Impactos Por outro lado, essas pessoas têm sentido na própria saúde o impacto da rotina de violência e da falta de perspectiva de futuro. A insônia tem afetado 39%. Com 33%, ansiedade aparece como a segunda doença mais presente. Depressão foi citada por 19% das pessoas. Outros 9% falaram sentir sintomas de crise de pânico. Além disso, 63% disseram ganhar, no máximo, R$ 3.040 por mês, o insuficiente para manter suas necessidades básicas. — Fingir que uma coisa não existe não resolve problema. O Data Favela não levantou esses dados para defender bandidos. O real propósito é elucidar o que leva essas pessoas a praticarem os crimes e pensar em políticas públicas para ajudá-las a sair dessa situação — afirma Cleo.

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