Tarcísio se move por anistia, enquanto se equilibra para despertar ira dos Bolsonaros e do STF
Desde a prisão e o trânsito em julgado de Jair Bolsonaro, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), passou a atuar com mais intensidade pela anistia aos envolvidos em todos os atos que culminaram no 8 de janeiro de 2023, incluindo o ex-presidente. A movimentação, no entanto, vem sendo conduzida com cautela.
No entorno do governador, a avaliação é que qualquer avanço fora do tom poderia ser interpretado pela família Bolsonaro como tentativa de ocupar um espaço político que, mesmo em crise, segue reservado ao ex-mandatário. Interlocutores afirmam que, em conversas reservadas, Tarcísio tem repetido que sua atuação se apoia na ideia de lealdade e gratidão.
Nos últimos dias, ele retomou ligações a parlamentares do Republicanos, entre eles o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Também buscou o senador Ciro Nogueira (PP-PI) e o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ). Segundo parlamentares, os diálogos foram objetivos. A percepção é que o governador tenta destravar a pauta, mas evita a impressão de liderança sobre o tema.
Em paralelo, Tarcísio prestou solidariedade e manteve contato com a família Bolsonaro. Falou com o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e com a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, além de ter pedido autorização para visitar o ex-presidente na sede da Polícia Federal. Aliados do ex-mandatário afirmam que o gesto buscou evitar ruídos num momento considerado especialmente sensível. Caso fosse liberado para estar com Bolsonaro, viajaria a Brasília e continuaria as articulações pela anistia presencialmente. Procurado, o governador não se manisfestou.
O périplo de Tarcísio também incluiu conversas com ministros do Supremo Tribunal Federal para avaliar alternativas que pudessem aliviar a situação jurídica do ex-presidente, inclusive a possibilidade de retorno à prisão domiciliar. O ambiente na Corte, porém, permanece pouco receptivo após a tentativa de rompimento da tornozeleira eletrônica.
Em público, o governador buscou reforçar que o apoio à anistia não se confunde com qualquer ambição eleitoral.
— Vou trabalhar para que a anistia seja pautada, para que possa ser aprovada. Não estou preocupado com desgaste. Eu falo com frequência com o Flávio Bolsonaro, e ele sabe que pode contar comigo — afirmou.
Tarcísio também afastou a leitura de que a prisão do ex-presidente reorganiza automaticamente a sucessão presidencial:
— A prisão do Bolsonaro não muda nada. Não tenho ansiedade. Pode ser janeiro, fevereiro ou março. Vai dar tempo. A gente precisa é construir o projeto vitorioso.
Preferido do Centrão
Apesar de negar pressa, seu nome ganhou tração no debate sobre 2026. No centrão, a avaliação é que Tarcísio consegue circular entre grupos que não dialogam entre si e, por isso, passou a ser visto como o nome mais competitivo.
Políticos influentes do campo conservador passaram a verbalizar a hipótese de ele ser o candidato nas eleições do ano que vem. O senador Ciro Nogueira afirmou ao GLOBO:
— Aposto que Tarcísio será candidato.
Até mesmo o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que acumulou atritos recentes com o governador, admitiu em entrevista ao UOL que pode apoiá-lo. A movimentação dele é acompanhada por outros nomes do núcleo mais duro do bolsonarismo, que veem com bons olhos a postura respeitosa de Tarcísio, embora cobrem um tom mais contundente diante da prisão do ex-presidente.
— Ele tem respeitado completamente o espaço político. Em momento nenhum se colocou ou se projetou como candidato, tem negado qualquer tipo de avanço. Existe um movimento orgânico em torno do nome dele. Só acho que é tímida demais a reação do Tarcísio. Ele não fala da perseguição — disse o vereador Adrilles Jorge (PL-SP).
A deputada Rosana Valle (PL-SP) pondera que o fortalecimento do governador não elimina o papel central da família Bolsonaro nas decisões sobre 2026.
— O Tarcísio é hoje uma das principais lideranças do nosso campo, mas ainda é cedo para falar em “nome natural”. Esse debate passa necessariamente pelo ex-presidente, pela família e pelos partidos da direita — afirmou.
Para Juliana Fratini, doutora em Ciências Políticas pela PUC-SP, a forma como Tarcísio tem se movimentado segue uma lógica típica de transição de liderança, mas com limites claros. Ela avalia que o governador tem mais musculatura institucional que outros nomes da direita e capacidade de dialogar com diferentes frentes, ao mesmo tempo em que depende do espólio bolsonarista para avançar.
— Ele sabe que não pode romper com o bolsonarismo, porque foi criado politicamente ali e ainda precisa desse eleitorado — disse Fratini.
Apesar das especulações, aliados afirmam que Tarcísio mantém uma rotina de contenção para evitar interpretações de antecipação eleitoral. Eventos que poderiam sugerir pré-campanha estão sendo evitados por enquanto. O governador tem optado por encontros com o empresariado paulista e eventos institucionais, que já faziam parte de sua agenda tradicional antes da prisão de Bolsonaro.
Oficialmente, ele mantém a intenção de buscar a reeleição em São Paulo, mas, no Palácio dos Bandeirantes, a avaliação é de que o cenário político ainda pode mudar. Um integrante do governo paulista resume o clima dizendo que a política funciona como uma “montanha-russa”, sinalizando que uma candidatura não está descartada.